O 11 de setembro marca o dia do Cerrado brasileiro, uma das savanas mais biodiversas do planeta. Ocupa 24% do território nacional e está presente em 11 estados e no Distrito Federal, indo do Paraná até Rondônia, passando por São Paulo, Bahia e Maranhão. Apesar de sua grande importância para a preservação da fauna e da flora, especialistas fazem um alerta: o avanço da agropecuária tem colocado em risco o futuro da savana brasileira.
Estudos indicam que a maior parte do desmatamento do Cerrado ocorre na região do Matopiba. Trata-se de área de fronteira agrícola que engloba os estados do Maranhão, de Tocantins, do Piauí e da Bahia. Entre janeiro e julho de 2023, 85% do desmatamento do bioma ocorreu nesta região, segundo análise do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).
A pesquisadora Patrícia da Silva destacou que o Cerrado tem sido considerado por estudiosos como uma zona de “sacrifício”. “A gente tem costume de olhar muito para a Amazônia e vai sendo mais permissivo com o que acontece no Cerrado, embora o bioma seja o berço das águas do Brasil e onde nascem oito das 12 bacias hidrográficas mais importantes do país”, disse.
Desmatamento
Enquanto o desmatamento na Amazônia diminuiu 42,5% entre janeiro e julho deste ano, no Cerrado cresceu 21,7% em relação ao mesmo período de 2022. Foram desmatados 582 mil hectares de Cerrado até julho deste ano, uma área semelhante ao tamanho do Distrito Federal.
Para o geógrafo e doutor em Ciências Florestais Yuri Salmona, diretor-executivo do Instituto Cerrados, o desmatamento vem crescendo nos últimos anos porque o Cerrado é um bioma desprotegido. Onde a governança ambiental foi deixada nas mãos do setor privado e dos governos estaduais. “O Estado brasileiro e a sociedade brasileira construíram o ideário de que o Cerrado é um bioma de sacrifício. Então, vamos sacrificar esse bioma em nome do agronegócio e em nome da própria preservação da Amazônia. Daí você vê uma dinâmica de que o desmatamento que iria para Amazônia vem para o Cerrado”, explica.
Atualmente, metade da área do Cerrado é ocupada pela produção de animais e grãos. Em 1985, a agropecuária ocupava pouco mais de um terço (34%) do bioma, segundo estudo do MapBiomas. O levantamento feito com dados de satélites revelou que, entre 1985 e 2022, a savana brasileira perdeu 25% da sua vegetação nativa para o desmatamento.
Agropecuária
A tendência é de que o desmatamento continue, uma vez que há previsão de expansão da agropecuária no Cerrado nos próximos anos, segundo pesquisa do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). A pasta prevê um aumento de 37% na produção de grãos no Matopiba em dez anos. Com isso, o setor deve aumentar a área explorada em 17%, o que representa uma expansão da fronteira agrícola de 1,6 milhão de hectares no período.
A produção agropecuária que predomina no Matopiba é realizada por grandes empresas, com investimentos internacionais, que produzem grãos em larga escala. Com produção altamente mecanizada, e voltada para exportação das chamadas commodities, que são matérias-primas em estado bruto, segundo a pesquisadora Patrícia da Silva.
O diretor-executivo do IPAM, André Guimarães, considera que o elevado grau de desmatamento do Cerrado coloca o bioma em “altíssimo risco”. Segundo ele, diferentemente da Amazônia, onde o desmatamento se concentra em terras públicas, no Cerrado a maior parte é em fazendas privadas, o que exige outro tipo de ação do Estado. “Nós estamos falhando enquanto Estado brasileiro ao não regulamentar os artigos do Código Florestal que geram incentivos para que o proprietário privado desista do seu direito de desmatar”, destaca.
Código Florestal
O Código Florestal, enquanto limita o desmatamento a 20% da propriedade privada na Amazônia, no Cerrado ele permite um desmatamento de até 80%. “Isso traz uma dificuldade para reduzir o desmatamento. No Cerrado, eles podem desmatar legalmente”, destaca Ane Alencar, coordenadora do MapBiomas Cerrado.
A pesquisadora Patrícia da Silva pondera que mesmo os desmatamentos tidos como legais estão com irregularidades. “As pesquisas que a gente tem feito apontam que, embora tenha uma boa parte desse desmatamento que sejam ‘legais’, ou seja, possuam Autorização de Supressão de Vegetação (ASV), essas autorizações apresentam problemas e irregularidades na sua expedição”, diz.
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