Após três meses de análise, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, denunciou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e mais 33 pessoas — sendo 24 militares — por organização criminosa armada, golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito, dano qualificado pela violência, grave ameaça contra patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
Nas 272 páginas encaminhadas ao Supremo Tribunal Federal, Bolsonaro é acusado de liderar a tentativa de golpe de Estado para impedir a posse de Lula, juntamente com o general Walter Braga Netto.
“Ambos aceitaram, estimularam e realizaram atos tipificados na legislação penal de atentado contra o bem jurídico da existência e independência dos poderes e do Estado”, escreveu Gonet. Segundo o procurador-geral, Bolsonaro adotou desde 2021 “tom de ruptura com a normalidade institucional em seus repetidos pronunciamentos públicos”.
Gonet menciona a reunião de Bolsonaro com os comandantes das Forças Armadas e o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, em 14 de dezembro de 2022, como uma ação preparatória para o golpe.
“Quando um Presidente da República, que é a autoridade suprema das Forças Armadas, reúne a cúpula dessas Forças para expor planejamento minuciosamente concebido para romper com a ordem constitucional, tem-se ato de insurreição em curso, apenas ainda não consumado”, diz o texto.
De acordo com a denúncia, Bolsonaro sabia e concordou com o plano para matar o presidente Lula, o vice Geraldo Alckmin e o ministro do STF Alexandre de Moraes.
Última esperança
Os atos golpistas de 8 de Janeiro, segundo a PGR, eram a “última esperança” para reverter a eleição de Lula. Segundo Gonet, a organização liderada por Bolsonaro “incentivou a mobilização do grupo de pessoas em frente ao Quartel General do Exército em Brasília, que pedia a intervenção militar na política”.
Para o procurador, o 8 de Janeiro “foi fomentado e facilitado pela organização” e, por isso, ela “deve ser responsabilizada por promover atos atentatórios à ordem democrática, com vistas a romper a ordem constitucional e impedir o funcionamento dos Poderes”.
STF
Cabe ao STF avaliar se aceita a denúncia e transforma os 34 acusados em réus, o que deve acontecer ainda este ano. A decisão será tomada pela Primeira Turma da Corte, integrada por Moraes, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin e Flávio Dino.
Se for aceita, o processo correrá sob a relatoria de Moraes até o julgamento. Caso seja processado e condenado, Bolsonaro pode ser sentenciado a até 43 anos de prisão.
Entre os denunciados também estão os ex-ministros Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Anderson Torres (Justiça), o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos e o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid, que firmou acordo de delação premiada e deve obter benefícios.
A equipe da PGR ainda analisa se há provas suficientes para apresentar denúncias também por fraudes em certificados de vacina contra a Covid-19 e venda de joias no exterior. Gonet priorizou a denúncia sobre a trama golpista por considerar que havia elementos mais robustos.
Bolsonaro
O ex-presidente Bolsonaro não se pronunciou após a denúncia, mas horas antes, em visita ao Senado, negou as acusações. “Nenhuma preocupação com essa denúncia, zero”, disse.
Sua defesa chamou a denúncia de “inepta” e criticou a delação de Mauro Cid, chamando-a de “narrativa fantasiosa” — mesmo termo usado pelos advogados de Braga Netto, que está preso, que também classificaram a peça de Gonet de “fantasiosa”.
José Múcio, ministro da Defesa, afirmou que a denúncia contra o ex-presidente e outros 23 militares representa um “constrangimento”. “É o que estávamos esperando, há um constrangimento, mas o bom é que isso acaba.”
Para Gonet, o Exército foi “vítima” do plano golpista, que, segundo ele, não se concretizou porque os principais comandantes da Força se recusaram a colocá-lo em ação.